Para o Lobo – Hannah Whitten

Sinopse Suma: O reino de Valleyda não via o nascimento de uma Segunda Filha há cem anos ― até a Rainha dar à luz Redarys, ou Red, irmã mais nova de Neverah. Seu propósito de vida é um só: o sacrifício. Ao completar vinte anos, Red se entregará ao temido Lobo em Wilderwood ― a floresta que faz fronteira com seu lar ―, para cumprir o pacto selado há quatro séculos e garantir a segurança não só de Valleyda, mas também de todos os demais reinos. Carregando o fardo de um poder que não consegue controlar, Red sempre soube de seu destino e está quase aliviada por cumpri-lo: na floresta, ela não pode machucar aqueles que ama. No entanto, apesar do que dizem as lendas, o Lobo é apenas um homem, não um monstro. E os poderes de Red são um chamado, não uma maldição. Enquanto descobre a verdade por trás dos mitos, a Segunda Filha precisará aprender a controlar sua magia antes que as sombras tomem conta de seu mundo. (Resenha: Para o Lobo – Hannah Whitten)

Opinião: Há comunidades forjadas e sustentadas por mitos e lendas. Acontecimentos há muito perdidos no tempo que vão ganhando outra forma, novas roupagens e acabam por influenciar as gerações seguintes. Num ciclo sem fim. O reino de Valleyda tem nas suas tradições uma força gigantesca. Ele se curva ao poder de um pacto que, segundo dizem, é o garantidor da paz. Para isso, basta que toda segunda filha do governante seja mandada em sacrifício para a floresta obscura. Enviada como uma prenda para o Lobo.

“A Primeira Filha é para o Trono
A Segunda Filha é para o Lobo
E os Lobos são para Wilderwood”

Hannah Whitten criou uma fantasia obscura, utilizou elementos bem conhecidos e inúmeras referências dos contos de fadas e produziu um romance forte, original e que flerta levemente (ok, às vezes mais descaradamente) com alguns clichês do gênero. Em tempos de obras fantásticas que seguem a mesma linha, com protagonistas trilhando caminhos pra lá de repetitivos, Para o Lobo é um livro que sobressai. Não só pela originalidade da trama, mas por uma escrita envolvente e quase poética. A autora fisga os leitores com descrições vívidas e dá cores a um ambiente por vezes bastante inóspito.

Para o Lobo vai falar de Red, a segunda filha que é mandada para a floresta em sacrifício. Criada para esse destino, ela é a protagonista passiva. Sabe o que precisa fazer, não discute e se entrega àquilo que todo o reino credita ser o certo a ser feito. Podemos até dizer que é a típica princesa perfeita de um conto de fadas. Red, tradução: vermelho. Não à toa ela usa uma vestimenta que a gente pode comparar com a capa com chapéu vermelho e tudo o mais que se perde numa dessas florestas mágicas da vida.

Mas existe também a primogênita, destinada a ser a próxima rainha. Neve (vejam só esse nome que coincidência, não?) encarna a revolta que deveria pulsar no coração da irmã. Ela não aceita essa história de sacrifício e acredita firmemente que a tradição do reino pode ser quebrada. Nada do que se conta é real. Tudo não passa de histórias que se perderam no tempo. Um pouco ingênua e ambiciosa, Neve vai fazer de tudo para resgatar a irmã do sacrifício. Vai ser facilmente manipulada pelos vilões e vilãs da história.

E o Lobo? Vive na floresta e é a seiva que a mantém de pé. O lobo, muito longe de um ser predador, é um homem marcado pelo peso dessa lenda sem fim. O perigo pode fazer dele um monstro, mas é no convívio com Red que eles vão descobrir que é possível, juntos, superarem essa tradição e mudarem um pouco o curso do destino. Mas aí, meus amigos, tem muita água para rolar e muita magia a ser despertada e controlada.

Bem elaborada, a trama de Para o Lobo reúne desde referências literárias aos contos de fadas a um universo elaborado de personagens que circundam esse trio principal. Em discussão, há o poder dos mitos influenciando e, por vezes, cegando comunidades. Quando ninguém questiona nada e a tradição, por mais bizarra que seja, se mantém forte, o que pode acontecer com um reino? Quando a religião é tomada por uma fanática a serviço dos vilões, e ninguém ousa questionar nada, quantas atrocidades podem ser cometidas?

“TER MUITO PODER POR TEMPO DEMAIS PODE TRANSFORMAR QUALQUER UM EM VILÃO”

Para além da fantasia, excelente, por sinal, Para o Lobo traz questões interessantes sobre o peso de aceitarmos tudo em nome de algo que nem sabemos se é real, passível de crença. O reino de Valleyda se curva ao pacto de enviar jovens de vinte anos para um sacrifício na floresta sem nunca se perguntar se aquilo é mesmo necessário, se existe outra saída, se o tal Lobo ainda habita aquelas paragens.

“MONSTROS DOS QUAIS NÃO TEMOS NENHUM REGISTRO HISTÓRICO REAL, MONSTROS QUE PARECIAM TOMAR A FORMA QUE MAIS AGRADASSE A PESSOA CONTANDO A HISTÓRIA. MAS, AINDA QUE FOSSEM REAIS, NÃO ACONTECEU NADA DESDE ENTÃO, RED. NEM SINAL DE ALGO VINDO DA FLORESTA…”

Complementando tudo isso, a história tem vários desdobramentos, é bem detalhada, rica em cenários e ambientações, com personagens muito bem criados, cenas de ação e magia para fã de fantasia nenhum colocar defeito e um sem número de boas sacadas e referências que fazem a alegria de quem gosta de descobrir uns easter eggs nas histórias.

Para o Lobo é classificado pela editora como uma fantasia dark e cumpre muito bem esse papel com originalidade. Peca por seguir a mania de não encerrar a história e deixar a continuação bem engatilhada, mas que pode dar um bom caldo caso a autora mantenha a linha criativa. É um universo interessante e bem envolvente que não decepciona os leitores. Foi umas das boas surpresas que tive em leituras no ano.